top of page

Distúrbios e estereótipos distorcem nosso próprio lar

A trajetória do corpo 

As primeiras memórias da universitária Larissa Costa retomam a imagem de um corpo que a incomodava. Desde pequena, seu peso era motivo de desconforto. Os quilos, considerados excedentes, acompanharam sua trajetória até os dezessete anos de idade.

 

Por causa do corpo que tinha, Larissa sempre escutou comentários que a machucavam. “Quando eu era mais novinha, tinha apelidos desagradáveis”, desabafa. Ela afirma que não se sentia no direito de paquerar ninguém porque se sentia inferior.  “Sentar em uma cadeira podia ser vergonhoso, porque o meu tamanho não era comportado em todas”, continua.

 

Nascida em um país cujo padrão de corpo feminino sempre fora cantado e exaltado na voz de Tom Jobim, seu corpo não se encaixava no ideal de estereótipo vigente. Por conta disso, sua infância foi acompanhada de endocrinologistas e nutricionistas. Cansada de tentativas em vão, procurou um jeito de emagrecer na juventude. Ela admite que seus métodos não foram adequados. Na tentativa de conseguir resultados rápidos, começou a pular refeições e reduzir porções. Em alguns dias, se alimentava em apenas um horário.

 

Curioso é pensar que as medidas de Larissa não seriam um problema em outras sociedades e eras. Na pré-história, mulheres gordas eram mais valorizadas. Exemplo disso foi a escultura de 11 centímetros encontrada por arqueólogos. A peça de 28 mil anos, batizada como Vênus de Willendorf, retrata uma moça com seios fartos e cintura larga. Esse corpo era considerado ideal na época visto que enfatizava o poder de fertilidade.

 

O historiador Herbert Bonomastro explica que o contexto histórico ajuda a compreender os padrões de beleza. “Os padrões estão ligados a questões sociais, biológicas, estéticas e até mesmo políticas”. Ele revela que, durante a Idade Média, as mulheres de pele clara eram ícones pois representavam a nobreza.

 

Herbert enfatiza que o estereótipo de beleza é temporal. “Os agentes sociais se alternam e levam consigo os padrões de belo”, esclarece. A volatilidade da moda reforça essa teoria. Recentemente, nota-se uma ascensão da tendência fitness. Esse termo, em sua essência, prioriza um estilo de vida saudável. Entretanto, o historiador alerta para o fato de que, ao ganhar sentido mercadológico, muitas pessoas arriscaram a saúde para adquirir o corpo da vez. Larissa foi uma delas.

"Sentar em uma cadeira podia ser vergonhoso porque meu corpo não era comportado em todas"

Alt

Ana e Mia, apelidos carinhosos para algo nada agradável

Você já ouviu falar de transtornos alimentares? São doenças diretamente ligadas a mudanças radicais no comportamento nutritivo e na percepção da forma física. De acordo com estimativas da Organização Mundial de Saúde (OMS), 1 a 4% da população mundial enfrentará algum tipo de distúrbio do gênero durante a vida. Esses problemas ocupam o primeiro lugar na lista de doenças psiquiátricas que mais causam morte em todo o mundo.

Segundo o psiquiatra Antônio Carlos Oliveira, os transtornos psicológicos estão ligados a preocupações exageradas em relação a forma física e uma baixa autoestima. “São desencadeados por pensamentos distorcidos que elegem a magreza como ideal de vida e de beleza. As causas são fatores biológicos, psicológicos e sociais”, explica.

A Vigorexia, por exemplo, faz com que a pessoa se veja mais fraca e magra do que realmente é. A partir disso, desenvolve compulsão por exercícios físicos e vive em busca do corpo perfeito. Entretanto, os distúrbios mais comuns são a Anorexia (Ana) e a Bulimia (Mia), assim são chamadas pelas vítimas dessas mazelas.

Os anoréxicos têm uma visão distorcida do seu corpo, além de serem obcecados pelo peso. O portador de anorexia não come adequadamente e pratica exercícios excessivamente. Quem tem bulimia, por sua vez, é compulsivo por comida e logo após comer força o próprio vomito ou toma laxantes, pois se sente arrependido e culpado.

A nutricionista Michelle Barbosa esclarece que a bulimia tem quadros de pico alimentares. Em alguns momentos a pessoa restringe muito a alimentação e em outros ela come de forma exagerada. “Ficam sem chocolate por muito tempo, mas devoram um bolo inteiro quando decidem comer”, afirma.

 

Segundo Michelle, a anorexia é a privação total da alimentação, além de procurar outros métodos para emagrecer. “A anorexia é altamente restritiva, procura por alimentos de baixa caloria, bebe muita água e muitas vezes procura por outros métodos para emagrecer, como dietas malucas e medicamentos”, enfatiza.

Quando ouvimos falar sobre transtornos alimentares ou preocupações sobre a imagem corporal, raramente pensamos em homens. Entretanto, o estudante Bruno Novais começou a ter transtornos alimentares aos 12 anos, após sofrer por bullying na escola. “Perdi muito peso, mas nunca era o suficiente, me olhava no espelho e me sentia gordo”, relata. Determinado a perder peso ele começou a fazer dietas malucas. Aos 14 anos, entrou em quadro bulímico. “O pouco que eu comia, vomitava. O vomito se tornou muito comum a ponto de eu ir em um restaurante e me levantar discretamente para ir ao banheiro vomitar”, relembra. Hoje com 21 anos, ele não se considera curado, mas procura ter uma alimentação saudável e o desejo de não engordar ainda é presente em sua vida.

Os transtornos alimentares são doenças tratáveis e nada substitui o acompanhamento médico. “A psicoterapia é de fundamental importância e geralmente necessita de suporte medicamentoso, em alguns casos é necessário a internação hospitalar”, finaliza o médico especialista em psiquiatria.

"O pouco que eu

comia, vomitava"

"Ficam sem chocolate por muito tempo, mas devoram um bolo inteiro quando decidem comer"

ALTCAST

Pegue seu fone de ouvido, ajeite-se onde quer que esteja sentado e se permita emocionar com a inspiradora história de Jéssica Rodolfo. 

Minha casa - Thamiris Senis
00:00 / 00:00

Entre o prazer e a nutrição

 

Antes de se servir é importante considerar qual é o motivo pelo qual se está comendo. A psicóloga Fabiola Luciano ergue a pergunta: que fome eu quero alimentar com essa refeição? “Muitas vezes é uma fome emocional que não é suprida por nada que a gente coma”, revela, se referindo aos excessos e restrições extremas. Há vários casos em que o transtorno alimentar tem que ver com algum transtorno psíquico como ansiedade e depressão.

 

A nutricionista clínica comportamental, Fernanda Timerman, explica que apresentar sofrimento físico, emocional ou social em relação à maneira como come e na sua relação com o corpo; falar muito sobre dieta e sempre tentar algo novo, restringir cada vez mais a alimentação ou apresentar descontrole e se isolar por qualquer problema relacionado ao temor de não ter o que comer são alguns dos sintomas do desenvolvimento de alguma doença relacionada à má alimentação.

 

Foi só depois de experienciar a obesidade, a tão sonhada magreza e um distúrbio alimentar que Erika Elenbaas entendeu que tem muita história para ser contada da forma como lidamos com a comida e com nós mesmos.  Hoje ela é desenvolvedora do blog Brigadeiro de Alface que começou como um desabafo de sua experiência pessoal e atualmente ajuda pessoas a encontrarem equilíbrio na corda bamba de nutrição e prazer provenientes do alimento.

Tudo começou em 2010 quando ela começou uma dieta que a permitia ingerir 1.200 calorias por dia. Como essa era uma missão quase impossível, quando ela deslizava em um chocolate aproveitava para chutar o balde naquele dia e comer tudo que desejasse. No dia seguinte, dieta de novo. E assim entrou em um ciclo de pouco, muito, pouco... Isso aconteceu até se tornar frequente. “Eu me sentia péssima depois disso, extremamente culpada, envergonhada e solitária por não dividir essa dor com ninguém porque eu não tinha coragem”, desabafa.

A psicóloga revela que para manter o equilíbrio nessa questão, é essencial não perder de vista o referencial de si mesmo. “É um exercício diário e naturalmente difícil, porque como seres sociais temos necessidade de aprovação social”, afirma. A especialista acredita que o ideal seja se perguntar até onde essa aprovação é válida para que a pessoa não viva só para os outros. “Quando a gente faz isso, perde de vista quem a gente é, a nossa identidade e se torna só um modelinho que quer se encaixar em algum lugar e isso passa a não fazer sentido”, declara.

A fim de compensar as calorias, Erika passava horas na academia para manter o peso, começando um novo ciclo. Com a ajuda do esposo, procurou auxilio profissional e começou seu tratamento em um centro especializado em distúrbios alimentares na Holanda. Erika também aprendeu que comer de forma considerada não saudável faz parte e, acredite, é saudável. Ela descobriu, por bem ou por mal, que equilíbrio é viver bem com o alimento.

Algo te incomoda no corpo em que habita? 

Direção: Prof. Me. Andréia Moura

Contatos: (19) 3858-9072

                    abjnotícias@gmail.com

                   @abjnoticias

REALIZAÇÃO

EXPEDIENTE

 

Editora chefe: Prof. Dr. Karla Caldas Ehrenberg

Secretária de Redação: Emanuely Miranda


Repórteres: Emanuely Miranda, Juliano Santos, Lia Costa, Ronaldo Pascoal, Thaís Fowler, Thamiris Senis e Victória Coelho


Programação visual: Emanuely Miranda e Rafael Cardoso


Vídeo: Lia Castro e Rafael Cardoso


Infográfico: Juliano Santos

Fotos: Lia Castro

Modelos: Eliane Ramos, Isabela Lenz, Matheus Tineli e Pollyana Mamedes

bottom of page